sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

ARTIGO - São Sebastião e as 7 flechadas

Artigo publicado em Plurale: http://www.plurale.com.br/site/noticias-detalhes.php?cod=15343&codSecao=5

Por Nélson Tucci, Colunista de Plurale

“São Sebastião crivado / Nublai minha visão / Na noite da grande / Fogueira desvairada” – Estação Derradeira, de Chico Buarque.

Janeiro começa assim: Massacre em presídio de Manaus deixa 56 mortos. O mundo, estarrecido, assiste a um degradante espetáculo promovido por detentos do Complexo Anísio Jobim, no Amazonas. Flecha 1.

Na semana seguinte, outros 26 presos são mortos – com decapitação, inclusive – na penitenciária de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte. Nesta última semana, de 16 a 21 de janeiro, assistimos à barbárie explícita, com os presos dando o tom da “orquestra”. Enquanto as TVs filmavam o que podiam do presídio (literalmente) fincado nas areias potiguares e as autoridades competentes decidindo se entravam ou não nos domínios do crime organizado, outros tantos foram executados. Até o fechamento deste artigo não se sabiam quantos (o chute variava entre 2 e 10) mais tinham morrido; e a rebelião continuava. Flecha 2.

Especialistas de tudo quanto é lugar aparecem nessas horas. Um deles, na TV Gazeta, chegou a afiançar que existem hoje no país mais de duas dezenas de facções tocando o terror por aí. A jornalista Maria Lydia, que o entrevistava, estimou em 27. Digamos que a margem de erro possa ser considerada com 3 pontos percentuais para cima ou para baixo... Neste mesmo Brasil existem hoje 35 partidos políticos registrados. Ou seja, numericamente a coisa está muito próxima. Flecha 3.

Os números não são exatos pra quase nada nessa área, por isso a ministra Cármen Lúcia – que preside o Supremo Tribunal Federal – tem projeto para realização do censo carcerário no país. O custo (estimado em R$ 18 milhões) pode ser um impeditivo, mas a ideia está posta. “Um preso no Brasil custa R$ 2,4 mil por MÊS (grifo nosso) e um estudante do ensino médio custa R$ 2,2 mil por ANO. Alguma coisa está errada na nossa Pátria amada”, disse ela, em novembro último.

Calcula-se (com base no censo anterior), que existam mais de 640 mil presos no país (3,7% dos quais mulheres), dos quais 67% seriam negros/pardos e, do total geral, 53% com o curso fundamental incompleto. Atrás de Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhão) e Rússia (680 mil), o Brasil é o quarto país no mundo com mais presos. Flecha 4.

Em 1993 eu entrevistei para a extinta Revista Visão (grupo Maksoud e depois DCI) Walter Fanganiello Maierovitch. À época juiz de Direito e bem depois desembargador do TJ de São Paulo e secretário nacional antidrogas da Presidência da República. Simpático ao falar, conhecia bem a situação criminal na Itália, através de estudos e intercâmbios. Maierovitch bateu muito na questão do “estado paralelo” e lançou vários alertas. Nesse período ouvia-se falar, muito raramente, em uma ou duas facções e assim mesmo praticamente restritas ao estado do Rio. Ele estudava e fazia analogias com o modus operandi da histórica máfia italiana já naquela época. E se mostrava incomodado com a falta de firmeza das autoridades brasileiras para se matar a coisa ruim no nascedouro. De lá para cá se passaram 24 anos e muita gente achava que a pior coisa que acontecia era o Sebastião Lazaroni dirigir a seleção canarinho. Flecha 5.

O sistema prisional tupiniquim está botando gente pelo ladrão. Faltam vagas e sobram candidatos. Há quem veja na construção de novos cárceres a resolução dos problemas. Flecha 6.

Morreu o ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF, mas o processo deverá continuar, com delações, apurações e, talvez, novas prisões. O país aguarda, ansioso, por novas revelações e espera enxergar o fim dessa “operação limpeza” em algum momento. Já o investidor internacional fica acabrunhado em investidor seu dinheiro na turbulência. Como o país não tem poupança interna, depende da grana dos gringos, que por sua vez dependem do andar da carruagem nestas verdejantes – e não raras pantanosas – paisagens. Enquanto não sabem quem está no controle, lá vem mais uma flecha. A de número 7.

E à turminha aqui do andar de baixo resta rezar para São Sebastião – aquele mesmo, patrono do Rio de Janeiro e que inspirou o nome de Lazaroni que, por sua vez, antecedeu o Felipão dos 7x1.

“Glorioso mártir São Sebastião, protegei-nos contra a peste (da febre amarela, da dengue e da chikungunya), a fome (de emprego de quase 13 milhões de trabalhadores) e a guerra (das facções, dentro e fora dos Presídios e Prostíbulos); defendei as nossas plantações e os nossos rebanhos, que são dons de Deus para o nosso bem e para o bem de todos. E defendei-nos do pecado (da corrupção), que é o maior de todos os males”.

No sincretismo, vamos de Okê! Okê Arô! Oxóssi. Salve o Grande Caçador !